Lebução fica situada em lugar alto e aprazível, na margem esquerda do rio Calvo, entre montanhas onde o tempo guardou riquezas e mistérios. A 25km da sede do concelho, goza de um clima de montanha com invernos frios, verões quentes e de paisagens deslumbrantes.

É uma aldeia tradicionalmente vocacionada para a agricultura (centeio, batata, castanha e vinho) e para o comércio de largas tradições. Em tempos remotos, Lebução, foi o centro das transacções comerciais de uma enorme área circundante, que se efectuavam por troca directa de produtos.

Monumentalmente, a Igreja abraça, do alto das suas torres sineiras, todo o casario disposto em anfiteatro e chama os fiéis à oração. É obra da renascença, de muros altos e bem alinhados, construção de uma só nave. O retábulo do altar-mor, é de apreciável valor artístico, com colunas salomónicas e motivos ornamentais e simbólicos, realçando as arquivoltas que guarnecem a abóbada polícroma da tribuna.O Orago da freguesia é S. Nicolau, mas a principal referência religiosa desta terra é Nossa Senhora dos Remédios, que tem o seu dia no calendário religioso - 8 de Setembro.

Aqui, como em todo o Nordeste de Portugal, usa-se uma linguagem oral, um conjunto de termos e expressões que, pouco a pouco, se vão perdendo com a partida dos mais idosos.

A hospitalidade está presente nas vivências diárias, marcadas por um espírito de partilha e solidariedade. A porta das casas de Lebução está sempre aberta para receber, à boa maneira transmontana, "quem vier por bem".


A ideia deste Blogue, surgiu da necessidade de preservar a identidade desta comunidade, aproximando todos os Lebuçanenses da sua terra natal.

A feira do Folar de Valpaços

domingo, 20 de junho de 2010

Saramago morreu


Foi galardoado com o Nobel de Literatura de 1998. Também ganhou o Prémio Camões, o mais importante prémio literário da língua portuguesa. Saramago foi considerado o responsável pelo efectivo reconhecimento internacional da prosa em língua portuguesa.
O seu livro
Ensaio Sobre a Cegueira foi adaptado para o cinema e lançado em 2008, produzido no Japão, Brasil e Canadá, dirigido por Fernando Meirelles (realizador de O Fiel Jardineiro e Cidade de Deus). Em 2010 o realizador português António Ferreira adapta um conto retirado do livro Objecto Quase, conto esse que viria dar nome ao filme Embargo, uma produção portuguesa em co-produção com o Brasil e Espanha.
Nasceu no
distrito de Santarém, na extinta província do Ribatejo, no dia 16 de Novembro, embora o registo oficial apresente o dia 18 como o do seu nascimento. Foi director-adjunto do Diário de Notícias. Juntamente com Luiz Francisco Rebello, Armindo Magalhães, Manuel da Fonseca e Urbano Tavares Rodrigues foi, em 1992, um dos fundadores da Frente Nacional para a Defesa da Cultura (FNDC). Casado com a espanhola Pilar del Río, Saramago viveu na ilha espanhola de Lanzarote, nas Ilhas Canárias.


CARTA PARA JOSEFA, MINHA AVÓ


Tens noventa anos. És velha, dolorida. Dizes-me que foste a mais bela rapariga do teu tempo - e eu acredito. Não sabes ler. Tens as mãos grossas e deformadas, os pés encortiçados. Carregaste à cabeça toneladas de restolho e lenha, albufeiras de água. Viste nascer o Sol todos os dias. De todo o pão que amassaste se faria um banquete universal! Criaste pessoas e gado, meteste os bácoros na tua própria cama quando o frio ameaçava gelá-los. Contaste-me histórias de aparições e lobisomens, velhas questões de família, um crime de morte. Trave da tua casa, lume da tua lareira sete vezes engravidaste, sete vezes deste à luz. Não sabes nada do Mundo. Não entendes de política, nem de economia, nem de literatura, nem de filosofia, nem de religião . Herdaste umas centenas de palavras práticas, um vocabulário elementar. Com isto viveste e vais vivendo. És sensível às catástrofes e também aos casos da rua, aos casamentos de princesas e ao roubo dos coelhos da vizinha. Tens grandes ódios por motivos de que já perdeste lembrança, grandes dedicações que assentam em coisa nenhuma. Vives. Para ti, a palavra Vietnam é apenas um som bárbaro que não condiz com o teu círculo de légua e meia de raio. Da fome sabes alguma coisa: já viste uma bandeira negra içada na torre da igreja. (Contaste-me tu, ou terei sonhado que o contavas?...) Transportas contigo o teu pequeno casulo de interesses. E, no entanto, tens os olhos claros e és alegre. O teu riso é como um foguete de cores. Como tu, não vi rir ninguém. Estou diante de ti e não entendo. Sou da tua carne e do teu sangue, mas não entendo. Vieste a este Mundo e não curaste de saber o que é o Mundo. Chegas ao fim da vida, e o Mundo ainda é, para ti, o que era quando nasceste: uma interrogação, um mistério inacessível, uma coisa que não fazia parte da tua herança: quinhentas palavras, um quintal, a que em cinco minutos se dá a volta, uma casa de telha vã e chão de terra batida. Aperto a tua mão calosa, passo a minha mão pela tua face enrugada e pelos teus cabelos brancos, partidos pelo peso dos carregos - e continuo a não entender . Foste bela, dizes, e bem vejo que és inteligente. Porque foi então que te roubaram o mundo? Quem to roubou? Mas disto entendo eu, e dir-te-ia o como, o porquê e o quando se soubesses compreender. Já não vale a pena. O mundo continuará sem ti- e sem mim. Não teremos dito um ao outro o que mais importava. Não teremos realmente? Eu não te terei dado, porque as minhas palavras não são as tuas, o mundo que te era devido. Fico com esta culpa de que me não acusas- e isso ainda é pior. Mas porquê, avó, porque te sentas tu na soleira da porta, aberta para a noite estrelada e imensa, para o céu de que nada sabes e por onde nunca viajarás, para o silêncio dos campos e das árvores assombradas, e dizes com a tranquila serenidade dos teus noventa anos e o fogo da tua adolescência nunca perdida: "O mundo é tão bonito, e eu tenho tanta pena de morrer!" É isto que eu não entendo - mas a culpa não é tua.


( Carta publicada em 14 de Março de 1968, no jornal "A Capital")


Este, é no meu modesto entender, um dos mais belos textos escrito por Saramago.

5 comentários:

Paulo C. disse...

Uma abordagem diferente da obra de Saramago. Desconhecia de todo este bonito e emocionante texto, carta, dirigido à sua avó.

Armando Sena disse...

Foi-se o homem fica a obra. E que obra!

celestino disse...

Como é possível haver gente que o não considerava?
Ontem esgotaram todos os livros na feira do Porto. Será que vão ser lidos? Grande parte deles vão, certamente, ficar a apanhar o pó de uma qualquer estante. Ainda assim, outros serão devorados com avidez por muitos dos que só depois do desaparecimento do autor vão descobrir toda a beleza que as suas palavras encerram.
Escolheste um texto magnífico para homenagear o nosso Nobel. Só tu consegues descobrir, na hora certa, coisas que nos emocionam e nos dão uma vontade cada vez maior de viver e de lutar.
Obrigado, minha amiga.

Anónimo disse...

Uma pessoa que disse que preferia viver no estrangeiro do que na sua patria não merece nenhuma consideração

Alexandra Gomes disse...

Mais um Grande Português a deixar lugar na História Universal! O nosso país pode ser pequenino em tamanho mas é grande em história, sabedoria e literatura!
Paz à sua alma! Não deixemos morrer a sua obra, vamos continuar a divulgá-la além fronteiras!
Contudo não vou agora dizer que gostava da sua forma de escrever, não, não apreciava mesmo nada mas, tenho e devo respeitar quem gostava da sua Obra.