Homens e mulheres,velhos e novos, foram milhares os portugueses que partiram para o estrangeiro em busca de uma vida melhor. Deixavam tudo para trás, família e afectos, arriscando quanto tinham, por um destino envolvido em escuridão e incertezas. E avançavam, rumo ao desconhecido, com a esperança de construír uma vida melhor e, um dia, regressar, de vez, à sua terra.
A França atraía como nenhum outro país. Mais de milhão e meio de portugueses saíram para trabalhar na indústria, escrevendo, em páginas de sofrimento, trabalho, coragem e saudade, o período de êxodo que mais se colou ao imaginário colectivo nacional, bem patente neste poema de Adriano Correia de Oliveira:
Este parte, aquele parte
e todos, todos se vão
Ó terra ficas sem homens
que possam cortar teu pão
Tens em troca órfãos e órfãs
tens campos de solidão
tens mães que não têm filhos
filhos que não têm pai
Coração
que tens e sofre
longas ausências mortais
viúvas de vivos mortos
que ninguém consolará
O discurso político, fundamentalmente, dos últimos anos tem remetido os emigrantes portugueses para uma espécie de recanto da história. Uma nota de rodapé, crítica, colocada nas notícias de Verão dos jornais e telejornais, quase sempre relacionadas com o regresso à terra. Mas, o tempo, há-de dar-lhes, nas páginas da nossa história, o merecido lugar, conseguido à custa de trabalho, muito trabalho, saudades e solidão.
Agosto continua a ser mês de emigrantes e tempo para matar saudades. Rejuvenescem, por estes dias, as nossas aldeias, disfarçando a desertificação. Nas ruas quebra-se o silêncio, o conformismo, a solidão e ouvem-se vozes e gargalhadas que ecoam nos nossos corações. E abrem-se portas e janelas de casas que, há muito, se encontravam em silêncio. A alegria volta às ruas. É assim um pouco por todo o lado, e a minha terra não foge à regra, com toda esta gente que traz um novo colorido à aldeia, ao mesmo tempo que apaga saudades.
Saudades da terra, saudades das suas gentes, saudades das suas festas. Para voltarem à terra que os viu nascer, fazem milhares de quilómetros, e vão homenagear os entes perdidos, abraçar os seus familiares, correr as ruas da sua infância. Cheirar os pinhais, os eucaliptos e o rosmaninho, ver correr a água cristalina no ribeiro, beber a água na fonte, ouvir o som do gado, à tardinha, o bater dos seus cascos no empedrado da terra, de regresso aos currais. Ver ou idealizar a casa dos seus sonhos, contrastando com as construções antigas existentes, e fora de moda.
E os afectos à flor da pele, neste reencontro, repetido ao longo dos anos, porque, não tarda, estamos em Agosto.
Boas férias!
2 comentários:
(Emigrantes)
Vieram cedo
Mortos de cansaço
Adeus amigos
Não voltamos cá
O mar é tão grande
E o mundo é tão largo
Maria Bonita
Onde vamos morar
Na barcarola
Canta a Marujada
- O mar que eu vi
Não é como o de lá
E a roda do leme
E a proa molhada
Maria Bonita
Onde vamos parar
Nem uma nuvem
Sobre a maré cheia
O sete-estrelo
Sabe bem onde ir
E a velha teimava
E a velha dizia
Maria Bonita
Onde vamos cair
À beira de àgua
Me criei um dia
- Remos e velas
Lá deixei a arder
Ao sol e ao vento
Na areia da praia
Maria Bonita
Onde vamos viver
Ganho a camisa
Tenho uma fortuna
Em terra alheia
Sei onde ficar
Eu sou como o vento
Que foi e não veio
Maria Bonita
Onde vamos morar
Sino de bronze
Lá na minha aldeia
Toca por mim
Que estou para abalar
E a fala da velha
Da velha matreira
Maria Bonita
Onde vamos penar
Vinham de longe
Todos o sabiam
Não se importavam
Quem os vinha ver
E a velha teimava
E a velha dizia
Maria Bonita
Onde vamos morrer
Zeca Afonso
Ei-los que partem
novos e velhos
buscando a sorte
noutras paragens
noutras aragens
entre outros povos
ei-los que partem
velhos e novos
Ei-los que partem
de olhos molhados
coração triste
e a saca às costas
esperança em riste
sonhos dourados
ei-los que partem
de olhos molhados
Virão um dia
ricos ou não
contando histórias
de lá de longe
onde o suor
se fez em pão
virão um dia
ou não
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